Na literatura europeia, as mulheres costumam aparecer como donzelas em perigo, ou figuras oprimidas que buscam a liberdade através da transgressão dos costumes da época, ou então como tomadas pela insanidade. A heroína gótica aparece tanto como heroína quanto como vítima. Já na literatura gótica japonesa, vemos as mulheres como poderosas, sobrenaturais — também oprimidas, mas libertando-se dessa opressão, transcendendo sua angústia e tristeza e tornando-se espíritos vingativos, trazendo ruína aos homens que as haviam traído de alguma maneira. Temos esse tema aparecendo também nos próximos contos, A Esposa Vai Para o País de Tamba e o Homem é Amarrado no Monte Oe, que são registros do compêndio Konjaku Monogatari (coletânea de narrativas do ‘Agora é passado’, século XI).
É nesse ponto que se percebe mais claramente a costura proposta pela edição: uma conversa de características da literatura gótica entre autores e épocas, ao apresentar esses textos que vem antes de qualquer contato do Japão com o Ocidente (e alguns antes da existência da literatura gótica em si) e textos já do início do século XX, que claramente foram influenciados por seus antecessores.
Dessa forma, temos Akutagawa Ryûnusuke (1892-1927) abordando outro tema frequentemente associado à estética gótica, que é o horror, e isso é muito bem exemplificado no conto Pintura Infernal, que usa as palavras para pintar cenários grotescos e violentos. A vividez com que descreve a titular pintura infernal é de causar arrepios mesmo nos mais experientes leitores de histórias de terror. Ao ler esse conto, pode-se lembrar da obra de Edgar Allan Poe, mestre da literatura gótica americana. Assim como Poe, Ryûnosuke também teve uma vida conturbada e morte precoce, acelerada por problemas de saúde, e a melancolia de tal existência sofrida transborda nas páginas de seus escritos.